Locação por Temporada em Condomínios Residenciais: O que é permitido?
Nos últimos anos, impulsionado pelo avanço das tecnologias digitais e pela consolidação de plataformas como o Airbnb, o aluguel por temporada ganhou significativa visibilidade e adesão em diversas regiões do país.
O que antes era uma prática restrita a nichos específicos, hoje representa uma alternativa concreta de geração de renda para milhares de proprietários de imóveis, especialmente em áreas urbanas e turísticas.
Contudo, essa popularização trouxe consigo um conjunto de desafios e controvérsias, sobretudo no que diz respeito à convivência coletiva em condomínios residenciais.
A questão central não reside apenas na legalidade da prática, prevista pela legislação brasileira, mas sim nos seus impactos práticos sobre a segurança, tranquilidade e dinâmica social desses ambientes.
Nesse contexto, o embate entre o direito individual de propriedade e os interesses coletivos dos condôminos tornou-se recorrente nos tribunais e nas assembleias condominiais, exigindo análise criteriosa sob os aspectos jurídico, social e administrativo.
Este artigo vamos discutir o que a legislação brasileira estabelece sobre a locação por temporada, discutir os principais pontos de tensão nos condomínios e apresentar orientações práticas para proprietários, síndicos e moradores lidarem com essa nova realidade de forma equilibrada e legalmente segura.
O que diz a lei sobre o aluguel por temporada?
A Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) regulamenta a locação por temporada em seu artigo 48, autorizando contratos com prazo de até 90 dias, seja para fins de lazer, trabalho, estudos ou tratamento de saúde.
A legislação permite essa modalidade de aluguel, desde que observados os critérios temporais e contratuais previstos, o que se alinha com o funcionamento das plataformas digitais que intermediam esse tipo de hospedagem.
Portanto, sob a perspectiva legal geral, o proprietário tem pleno direito de disponibilizar seu imóvel para locação de curta duração.
No entanto, essa liberdade encontra limites quando o imóvel está situado em condomínios residenciais, onde normas internas específicas podem restringir ou mesmo proibir a prática.
Por que a locação por temporada gera controvérsias em condomínios?
O cerne das controvérsias está na convivência coletiva.
Condomínios residenciais são, por definição, ambientes planejados para moradia estável, pautados por relações contínuas de vizinhança.
A rotatividade elevada de hóspedes, muitos deles desconhecidos dos demais moradores, pode acarretar preocupações legítimas quanto à segurança, ao uso indevido das áreas comuns, ao descumprimento das normas de convivência e à descaracterização do ambiente residencial.
Além disso, há uma interpretação jurídica que considera que a prática recorrente e comercial de locações de curtíssima duração pode se assemelhar à atividade hoteleira, o que configuraria um desvio de finalidade para imóveis situados em condomínios estritamente residenciais.
É nesse ponto que o regimento interno e a convenção condominial assumem protagonismo.
Se esses documentos proíbem ou restringem expressamente o aluguel por temporada, essa vontade coletiva deve ser respeitada, sob pena de configurar infração passível de sanções.
Cabe lembrar que, de acordo com o artigo 5º, inciso XXIII da Constituição Federal, o direito de propriedade deve atender à sua função social, ou seja, não pode ser exercido de forma que prejudique a coletividade.
Casos em que a locação por temporada é permitida
Apesar dos embates, há situações nas quais o aluguel por temporada é plenamente permitido dentro dos condomínios, desde que estejam observadas algumas condições:
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Ausência de proibição na convenção condominial: Quando a convenção e o regimento interno não contêm restrições explícitas à locação de curta duração, o proprietário pode exercer seu direito de dispor do imóvel, desde que não infrinja as normas de convivência já estabelecidas.
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Condomínios com uso misto ou comercial: Imóveis localizados em edifícios que permitem tanto o uso residencial quanto o comercial geralmente possuem maior flexibilidade quanto à locação por temporada, sobretudo em regiões urbanas de grande movimentação.
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Autorização deliberada em assembleia condominial:Algumas comunidades condominiais optam por deliberar em assembleia sobre a regulamentação dessa prática, estabelecendo regras específicas para sua execução, como comunicação prévia ao síndico, controle de acesso e penalidades para eventuais descumprimentos.
Cuidados essenciais para evitar conflitos
Se você é proprietário e pretende alugar seu imóvel por temporada, é imprescindível adotar algumas medidas preventivas:
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Verifique a convenção do condomínio e o regimento interno, certificando-se de que não há proibição à prática;
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Comunique previamente ao síndico sobre a chegada de hóspedes, sempre que possível;
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Estabeleça regras claras com os locatários, especialmente no que diz respeito a barulho, uso das áreas comuns, horários e segurança;
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Mantenha controle sobre quem entra no imóvel, solicitando documentos e evitando exceder a capacidade do imóvel.
Do mesmo modo, síndicos e administradoras devem atuar com diligência e imparcialidade:
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Promover assembleias para discutir a questão com todos os condôminos;
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Atualizar os documentos condominiais conforme as necessidades e a realidade do condomínio;
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Buscar o equilíbrio entre os direitos individuais dos proprietários e o bem-estar coletivo da comunidade.
Conclusão
O fenômeno do aluguel por temporada é parte integrante de uma nova dinâmica urbana, econômica e social promovida pela era digital.
Sua presença é uma realidade consolidada e, para muitos, representa uma alternativa legítima de diversificação de renda e otimização do uso do patrimônio.
No entanto, sua implementação em condomínios exige respeito às normas internas, diálogo entre os condôminos e compromisso com o interesse coletivo.
O exercício do direito de propriedade não pode se sobrepor à harmonia e segurança dos demais moradores, sob pena de desequilibrar a convivência e gerar conflitos judiciais desnecessários.
Assim, antes de anunciar seu imóvel em plataformas como Airbnb, é imprescindível compreender o que está disposto na convenção condominial, buscar consenso nas assembleias e agir com transparência e responsabilidade.
Somente por meio desse equilíbrio será possível aproveitar os benefícios da locação por temporada sem comprometer a qualidade de vida nas comunidades condominiais.
Como afirmou Montesquieu, “liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem”.
E, no contexto condominial, essa liberdade encontra sua plenitude quando está em sintonia com o bom senso, a legalidade e o respeito mútuo.